sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Concrecoisa Tempodeus


Certo dia, o tempo quis saber quem ele era.

Perguntou para a luz, irradiada d’uma estrela próxima.

Quando ia responder, uma matéria desconhecida que vagava pelo espaço ficou na frente da estrela e fez a noite chegar.

O tempo, então, correu para Terra, planeta com vida, e lançou o mesmo questionamento para o mar.

O mar, sem saber responder, disse que o ar tinha a resposta.

E lá foi o tempo, instantaneamente, perguntar para o ar.

O ar, também sem saber responder, preferiu virar vento, em fuga.

O tempo, inquieto, viu no fogo do vulcão a possibilidade da resposta.

O fogo, sem saber responder, apagou-se em si.

Restou ao tempo perguntar para o animal racional que estava destruindo a Terra.

Se achando dono da verdade e de tudo, o homem levantou a voz, em mais um ato de prepotência.

Antes de concluir a resposta, já velho, o homem morreu.

Foi aí que o tempo viu que ele era Deus e sorriu com pena do homem.

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Concrecoisa Umbral


No umbral da fantasia

Em passeio pelo astral

O índio virou astronauta

Ao vestir o manto da ficção

Galopou num dente-de-leão

Ficou pra lá de contente

Assistiu o mundo esfriar

E com aura de ser vidente

Viu o dinossauro desaparecer

E o gelo derreter em mar

E ainda no astral singular

Uma bola de fogo fez a cor

Mais doce que o algodão-doce

Da saborosa maçã do amor

O tempo flerta como fã

Com as camadas da mente

O astronauta virou talismã

Fez o dia nascer num crescente 

Um beijo sem limite

Transformou o dente-de-leão

Na bela deusa Afrodite

Mas ela escapou da minha mão

E invadiu o meu coração

A letra de canção acima, em parceria com Luiz Caldas, intitulada Índio Astronauta, motivou a Concrecoisa Umbral. Se desejar ouvir, acesse o site http://www.luizcaldas.com.br e o disco de MPB Pedido Aceito.

sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Concrecoisa Dentro e fora


A gema adormece dentro do ovo.

A casca do ovo dialoga com o mundo exterior, o mundo de fora.

A casca está do lado de fora.

Enxergar o que é dentro e o que é fora depende do ponto de vista, do referencial.

A gema do lado de dentro do ovo também está do lado de fora, tendo como referencial o interior da galinha, de onde o ovo saiu.

A casca do ovo está dentro da caixa de ovos, que está dentro do supermercado.

E assim tudo acontece, seja o que seja, gema ou ovo.


Todos estão dentro, estão fora, estão dentro e fora.

sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Concrecoisa Telhado


Em autobiografia, uma telha contou que tinha se apaixonado pelo céu.

Numa das suas passagens, narrou que chorou por não ter nascido em berço de vidro.

Já nas últimas linhas do texto na primeira pessoa, falou do passar do tempo, da exposição ao sol e da chuva que lambia as suas mágoas.

A telha disse ainda que o telhado da casa era o verdadeiro sentido da vida em sociedade igualitária.

Ali no telhado, com uma telha imbricando na outra, o tempo corria sem dar conta de si.

Um dia, antes da demolição da casa, a chuva constatou que “o tempo deixa na telha a cor de sua marcha”.

Foi quando a telha chorou...

Os tempos eram outros.

E a laje da nova casa instaurou o totalitarismo.